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OPINIÃO: O principal dilema brasileiro: infância excluída e violentada

No final da década de 1960 ou primeiros anos de 1970, em passeio pela primeira quadra da Dr. Bozano, agora Calçadão, um estimado amigo, retornando de viagem ao Oriente Médio, falou-me do imenso impacto que sentira ao ver rostos e expressões das crianças nos campos de refugiados. Triste, fez previsões de que ali estava uma geração condenada à dor e ao ódio, com suas vidas comprometidas, futuro tendente ao sofrimento e à violência. A angustiada profecia cumpre-se até hoje nas trilhas de radicalização naquela região e nas organizações que surgiram apelando inclusive para práticas terroristas.

Impressionado pelo relato, tal lembrança me vem à mente cada vez que reflito sobre parcela da população brasileira na atualidade.

Ano passado, a Brigada Militar realizou operação para prender grupo de pessoas envolvidas em ação criminosa, todas ligadas a uma violenta organização do trá- fico em Porto Alegre. Como eram vários homens jovens detidos, foram colocados em ônibus para condução até a delegacia. Vídeo gravado a bordo repercutiu nas redes sociais. Era espetáculo deprimente a fala entre eles: escassos e rudes recursos verbais, reações brutas, aquela coisa de quem sobrevive apenas para matar ou morrer.

Temos milhares de jovens gerados e crescidos nas mais adversas condições de vida, somente conhecedores da miséria, exclusivamente educados na violência. E continuamos o ciclo cruel de exclusão social e de destruição dos valores humanos em outros milhares de crianças neste momento, comprometendo sucessivas gerações.

Se no presente impactam a violência e a desordem social, continuando esta brutal exclusão, o futuro será pior.

O que o porvir reserva para milhares de crianças submetidas a miséria, agressões e desamor, em acampamentos, ocupações, cortiços, ruas, conglomerados urbanos sob a égide do crime organizado? Quais os valores humanos que lhes são acessíveis? Qual educação que não seja a pedagogia da opressão e da violência?

Estamos gerando, como sociedade, legiões de zumbis, incapazes de raciocinar para além da lógica de quem atira primeiro, de se ver fora da sombra de alguma organização violenta, saciados apenas pelos escassos prazeres de ostentar bens de consumo roubados e de orgias ao som de um "funk". E outras tantas legiões de miseráveis aos quais é negado o básico para uma vida digna.

Certamente, pessoas que tenham se dado conta deste quadro caótico logo pensarão em governos. Faltam políticas públicas para enfrentar todos os desafios desta situação. É verdade. Mas, também é verdadeiro e real que somente governos não resolverão. Há décadas advirto: problema "social" é responsabilidade de toda a sociedade, como o nome já está dizendo. Não é assunto somente "estatal". precisa de uma consciência comunitária, forte e decidida, para chegar a soluções. Bons governos, se os tivermos, ajudarão. Mas, não bastarão. A cada um de nós cabe parcela de responsabilidade e dar um primeiro passo. Ou agimos todos ou fracassamos todos.

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